domingo, 18 de março de 2012

O dia em que eu não nasci - Projeto Um filme sempre que valha a pena


O Dia em que eu não nasci

Filme magnífico, imperdível e cheio de qualidades raras no cinema atual. Uma pérola das que nos deixam feliz de poder encontrar tantas coisas boas num filme só.

A argentina deve ter feito seu expurgo e sua catarse em relação à ditadura e aos desaparecidos, tamanha quantidade de filmes que foram feitos sobre o período, logo após o fim da ditadura e os processos investigativos que ainda acontecem por lá. Ao contrário de nós brasileiros, que também tivemos nossa ditadura, desaparecidos, torturados e demais crimes, mas acobertamos tudo com uma anistia covarde, los hermanos tiveram o peito de iniciar, sempre com a dificuldade de desvelar o passado, pelos meandros do poder sempre imundo, o que se deu no seu passado.

E fizeram isso tantas vezes que hoje há espaço para assistirmos a um filme como este. Maria é uma nadadora alemã, por um acaso vem parar em Buenos Aires, e uma sequencia de eventos a levará a descobrir quem de fato é, o que ocorreu na sua vida, como chegou a ser aquilo que imaginava ser sua verdadeira identidade.

O filme constrói com uma fotografia saturada sempre, um clima de tensão, expectativa e descoberta passo a passo, Maria descobre que foi filha de argentinos e não de alemães, que seus pais foram torturados e ela levada pelos que trabalhavam com eles na Argentina, sem a chance de ficar com sua família. Não conto mais nada, isto é só para situar uma linha do roteiro.

Há entretanto uma cena absolutamente maravilhosa, Maria leva um namoradinho para servir de tradutor, e fazer as perguntas e respostas para a família de sua mãe, que ela descobriu estar em Bs As ainda. E a tia/madrinha lhe pergunta coisas e vice versa, e o namorado faz as traduções, e o namorado é um policial, filho de outro policial possivelmente envolvido nos crimes da ditadura. Maria mais tarde lhe perguntará se ele nunca quis saber o que seu pai fizera naqueles anos, e o filho responde “Não, não desejo saber de algo que possivelmente me faria odiá-lo”

E esta é uma das leituras do filme, que tempo terá de passar, e quantos segredos escondidos necessitarão apodrecer até que consigamos assumir uma identidade, destruída por processos de expurgo, morte e tortura. Socialmente perdeu-se uma grande quantidade de pessoas nos processos de ditadura, mas mais que isso, perderam-se forças, idéias, concepções, que faziam parte de identidades nacionais, grupais e pessoais. Aos sumir com as pessoas, rompem-se canis identitários, deixamos de ser, como povo, aquilo que éramos, e não somos mais nada, somos algo perdido, somos algo a buscar, construir identidades de frangalhos e restos, esparsos, perdidos, incompletos.



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