quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Formação do império americano - Projeto um livro sempre



Luiz Alberto Moniz Bandeira – Formação do império americano

Este livro não é o Inferno de Dante, mas a recomendação de que deixemos ali a esperança os que entrem, cabe tão bem quanto naquele. Este é um livro de desesperança. É um livro de vertiginosa e ampla apresentação de uma história que ainda nos engloba e à qual estamos impreterivelmente sujeitos, a história da formação do império americano.

Creio ser evidente o porque este império tem mais importância atualmente que outros, afinal é a ele que estamos sujeitados, é com ele que as relações políticas, econômicas e militares ocorrem sempre de modo importante, e é o peso dessas ações (ou impedimentos) que altera, modifica ou impulsiona outros desdobramentos, com outros países, regiões e personalidades.

Foi assustador ler os bastidores de diversos eventos que conhecia pelo lado “solar”, pelo que é contado, publicado, pelo que pôde vir à luz, e entender que aquilo era a parte que se desejava ser mostrada, que o buraco (do inferno...) é muito mais profundo.

Há a parte da história da formação dos EUA como país, que serve para delinear a mentalidade expansionista massiva. Conforme o calendário caminha para o século XX vemos o país Estados Unidos tornar-se a potência que é hoje, e o jogo que fez (na verdade os jogos, porque são sempre muitos, mas muitos mesmo, jogados simultaneamente) para chegar a esse lugar e principalmente para manter-se. Todo o confronto propagandeado com a URSS e a luta contra o comunismo, uma bobagem que visava tão somente a ampliação da maquina de guerra.

E é apavorante entender como o complexo militar é tão, mas tão influente na política expansionista, criando meios para fazer-se sempre mais importante, custoso e presente. Independe de quem é o presidente e suas promessas, uns mais e outros menos, uns mais explícitos como os Bush pai e filho, gerados na caterva petroleira-bélica da América caipira, ou Clinton, de discurso menos beligerante mas que manteve todas as ações de seus antecessores.

O livro termina pouco depois da segunda eleição de Bush Junior, antes portanto da chegada de Obama ao poder, mas fica claro o porque da desilusão com este último no Capitólio: qualquer presidente se curvará ao mando industrial, não terá nenhuma possibilidade de enfrentar a máquina de guerra, ela já anda por si só, como as corporações já andam por si sós, na busca de lucros transnacionais, sem preocupações alem da propaganda de suas boas intenções e dos reais ganhos.

Por isso iniciei este texto com a lembrança do Inferno, porque não há salvação nesse movimento, não a curto prazo pelo menos, como todo império, este também ruirá, e os sinais da queda se acumulam, o aterrorizante é entender que num mundo tão globalizado, a ruína do império americano será a queda do mundo, the end of the world as we know it. Quem viver verá...


terça-feira, 2 de outubro de 2012

Intocáveis - Projeto Um filme quando valha a pena



Intocáveis
(Fra.2011)
Diretores: Eric Toledano, Olivier Nakache

Tenho dificuldade com comédias. Acho-as ridículas, gênero menor do cinema, apelando para a vulgarização, para o que temos de mais baixo, para preconceitos primários, ou ainda são fundadas em idéias, são comédias para entender e “rir” porque a idéia deveria ser muito engraçada, ainda que sua realização como filme não tenha a menor graça.

Então quando fico sabendo de alguma comédia arrebatando público saio correndo na direção oposta, as vezes em que tentei assistir, me arrependi de não ter feito os 100 metros rasos na linha de fuga. Por isso minha surpresa e alegria foi incontinenti ao assistir Intocáveis, já sabendo que era o filme francês de maior bilheteria e sucesso do ano.

Porque o filme é genial. Não consigo imaginar quem no mundo não gostará deste filme. Engraçado, inteligente, esperto, crítico, ácido até, mas acima de tudo, amoroso e cuidadoso com a humanidade da platéia, que consegue divertir-se sem ter de contentar-se em chafurdar na pocilga de preconceitos e vulgaridades para rir aquele riso repetido pelo (e do) que se conhece.

Uma das piores construções do fim do século XX e começo do XXI é o politicamente correto, essa necessidade de fazer de conta que não há diferenças, não há preconceitos e não somos todos atravessados por dificuldades em reconhecer o outro na estatura que ele gostaria de ter. O contorcionismo verbal que nos faz chamar o índio de nativo sul americano, ou o negro de afro descendente pode acalmar ânimos preconceituosos, mas esconde tudo o que sentimos pelos índios, negros, mulheres, minorias variadas e quaisquer outros que não sejam nossa imagem e semelhança.  Quando o filme foca a relação de um tetraplégico milionário branco e seu cuidador, um negro sem a menor queda pela condescendência, abre um espaço arriscado para que aquela série de preconceitos e vulgaridades tomasse a frente, ou para que o politicamente correto se fizesse ouvir, pela assepsia de piadas cuidadas a não ofender e ferir espíritos mais sensíveis.

Nada disso, temos aqui um humor vigoroso, sem pruridos de tocar temas delicados, rindo de si mesmo, do outro, do mundo e da platéia, de ícones culturais, da “alta” cultura, das relações amorosas, dos preconceitos, da cretinice revestida de bondade humana, deixando uma única coisa em pé depois de hora e meia de riso e momentos emocionados: a vida só faz sentido se enfrentada com a honestidade de que as diferenças são diferenças, e que nós nos fazemos.