Onde sonham as formigas
verdes
Werner Herzog
Alemanha Ocidental /
Austrália 1984
30 anos atrás existiam duas Alemanhas,
a do lado “de cá” tinha o Herzog fazendo filmes estupendos, dentre os quais
este merece um carinho especial. Faz muito tempo, e ao mesmo tempo é tão
recente!!!
Há muito, mas muito mais tempo ainda, houve o Tempo dos
Sonhos, o tempo mítico dos aborígenes australianos, que no filme se reúnem para
impedir explosões na terra que lhes é sagrada. Ali dormem e sonham as formigas
verdes, elas sonham o tempo, o tempo dos sonhos em questão. Se as explosões
coordenadas pelo geólogo Lance Hackett ocorrerem, elas irão embora e o mundo
vai acabar.
Curiosamente o caso vai aos tribunais, e mais curiosamente o
juiz é um cara muito consciencioso e razoável para as idiossincrasias culturais
em questão. Não tão curiosamente assim eles perdem a causa e as formigas irão
embora, como o tempo dos sonhos, como todo universo mítico/poético.
Há várias cenas inesquecíveis, emblemáticas da ruptura
epistêmica e de imaginário que os separa dos ocidentais. Um grupo de aborígenes
está no supermercado, sentados ao lado do sabão em pó e cera de sapatos, o
geólogo pergunta ao atendente o que seria aquilo e ouve que ali estivera a
única árvore de toda região, onde os pais vinha sonhar seus filhos, porque
primeiro os pais necessitam sonhar os filhos para depois eles poderem nascer. Digam-me
se a metáfora não é absolutamente poética e doce?
No tribunal um dos aborígenes começa a manifestar-se, mas
ninguém pode traduzi-lo, o juiz interpela os outros aborígenes, pois aquele que
falara havia sido descrito como mudo. Na verdade, sua língua não é entendida
por ninguém mais, ele é o último representante da tribo, e por não ser
inteligível chamam-no “mudo”.
E por aí vai. Muito antes do discurso ecologista, muito
antes de muitas coisas já estava esse fabuloso e ao mesmo tempo simples filme,
dizendo poeticamente as belezas e dores da perda do sonho. E das formigas
verdes...
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